Transcrição em Português 183 que o embaixador se resolvesse sem intentar outro recurso; mas o mesmo embaixador ainda não satisfeito se resolveu por último a escrever duas cartas, que mandou por um seu criado a Cantão, uma para o vice-rei em que lhe dizia, que como ali o tratavam como portador de tributo se resolvia a recorrer ao Imperador por meio de uma carta, cuja remessa pedia ao mesmo vice-rei, e juntamente que quisesse concorrer para se alcançar o seu passaporte; e na outra que ia para o Imperador lhe pedia o quisesse mandar receber como embaixador de Portugal, e como quem ia só da parte do seu rei a felicitar a sua exaltação ao trono, e não a pagar tributo. E para este recurso tomou o embaixador por pretexto, que os mandarins de Cantão o não podiam segurar fora do seu território. No dia 6 do mesmo mês chegaram a Macao dois mandarins inferiores, um da casa do vice-rei e outro da vila de Anção, e ambos para conduzirem o embaixador com 120 homens que consigo traziam. Logo que estes mandarins chegaram à Porta do Cerco (é a divisão de Macao com as mais terras da China) abateram as bandeiras, e outras insígnias do estado que traziam, e fizeram também calar as baticas, tudo em obséquio, e atenção ao embaixador. Estes mesmos mandarins lhe traziam um mimo do governador de Anção, que demais lhe mandou dizer que não vinha em pessoa porque estava molestado. No dia 8 visitaram os mandarins ao embaixador, que os recebeu com agrado e cortesia, não consentindo que lhe batessem cabeça como queriam, e no mesmo acto lhe deram o recado do governador de Anção, e lhe ofereceram com papel de visita e memória das coisas, como é costume seu, o mimo, o qual, o embaixador recebeu e correspondeu com outro; e aos mesmos mandarins mandou também algumas coisas, que receberam e pretenderam agradecer por meio de um Tiezu32 ou papel de visita, que se lhe não aceitou por ser em papel azul (sinal de uma grande humildade de quem oferecia); não fez assim o Patriarca Mezabarba, que até dos maiores mandarins da vila de Anção pretendeu Tiezu ou papéis de visita de semelhante papel, não advertindo no que ao depois lhe ia sucedendo em Cantão em menos atenção do seu carácter, como já acima notámos. No dia 9 mandaram os mesmos mandarins dizer ao embaixador, que o vice-rei de Cantão os avisava e ordenava lhe dissessem, que visto querer recorrer à Corte se podia no entanto que esperava a resposta passar a Cantão, onde tinha boas casas, e frescas. E no dia 10 de outubro se foram de Macao desgostosos de não acharem ao embaixador resoluto a passar à China, sem primeiro recorrer ao Imperador, quando o vice-rei e mais mandarins de Cantão entendiam se tinha reduzido, e da sua resolução se tinha já feito aviso ao seu Imperador, que poderia naqueles termos estranhá-lo. Aos 11 chegou de Cantão carta ao embaixador do mesmo seu criado, que tinha levado as duas para o vice-rei e Imperador, com aviso de que se lhe dificultava entregá-las e falar ao vice-rei, 32 Tiê, tiezu (chin. Tie, tie-tsz’), cartão de visita na China. Dalgado, “Tiê, tiezu” 2:372.
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