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Relação Oficial da Embaixada do Rei D. João V de Portugal ao Imperador Yongzheng em 1725-1728 200 segundo o que ouvi sobre os costumes da China, tinham os mandarins de obrigação assistir pessoalmente aos banquetes; porque os deram em uma sala, que tinham para a aposentadoria do embaixador se saísse para terra, e se não deixasse como deixou ficar na barca; e por se reputar o lugar dos banquetes, o da assistência do embaixador, era bastante à política de lhe mandarem os mandarins que ofereceram os banquetes, como mandaram outros mandarins que assistiram e tinham cuidado na administração e preparo dos mesmos banquetes. No dia 21 apareceram junto das nossas barcas vários chinas vestidos de amarelo, e reparando eu na qualidade da cor, porque só o Imperador a usa, perguntei que homens eram aqueles, que assim vestiam? E se me respondeu, que aqueles homens, porque passavam já de oitenta anos, em atenção à sua velhice, estavam isentos pelo Imperador dos encargos do mais povo, e para sinal lhe havia o mesmo Imperador dado aqueles vestidos, além de outros privilégios (que tanto como isto se respeita na China a velhice, e ancianidade dos homens, de tal sorte, que até os homens beneméritos, e de doutores para cima se dá o nome de Lauye [老 爺] que quer dizer o Senhor Velho). No dia seguinte, e outros mais que aqui nos dilatámos, era inumerável a gente que acudia a ver-nos, e até muitas mulheres levadas de curiosidade concorreram também a ver, se bem que fechadas em cadeiras por não faltarem ao grande recato, e honestidade exterior que tem este sexo naquele Império. No dia 30 de março, nos apartámos de Nan kim para outro sítio mais distante aonde se achavam prontas novas barcas, em que depois fomos até junto da Corte; e porque na barca do embaixador se achava escrita a palavra Kum que quer dizer tributo, se mandou logo tirar, e em seu lugar se não substituiu outra, ficando assim cessando todo o escrúpulo que poderia haver se não tirasse [sic]53 , se bem que nenhum poderia haver neste caso, nem presumir-se alguma malícia no mandarim que destinou as barcas, porque era a que coube ao embaixador uma das que costumavam levar para a Corte os tributos do Imperador, e para o denotar e que tinha escrita esta palavra Kum a que se seguia a palavra Famzu, e ambas juntas querem dizer “Tributo para a Casa Imperial” - de mais que esta palavra só se achava na barca do embaixador, e não assim na barca para onde se passou o mimo, que seria o caso, em que poderia entender-se alguma malícia. No dia 4 de abril chegámos a um palácio chamado San cha ho junto do qual se achava uma formosa torre, e um templo dos ídolos, e foi este palácio feito pelos contratadores do sal para o Imperador quando por ali passasse. Neste mesmo palácio estava o Imperador Kam Ky quando 24 padres jesuítas tiveram Piau, ou patente para estarem na China, sem embargo de um decreto do Cardeal Tournon, do qual antes de tudo apelaram, porque queria este que não seguissem os padres as praxes do padre Matteo Ricci da Companhia de Jesus, e o Imperador só queria no seu Império quem as houvesse de seguir (que tanta era a opinião que o Imperador da China, e todos faziam do mesmo Matteo Ricci); e a cada um dos 24 padres deu o Imperador nesta 53 “… se não se tirasse.”

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