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Transcrição em Português 213 do seu Tribunal dos Ritos, e outro em nome do régulo 13, para que se escolhesse o que lhe parecesse mais conveniente. Apenas o embaixador com alguns padres que se achavam presentes viram os dois memoriais e listas do mimo, repararam logo que em ambos no sobrescrito se achava a palavra Cim Kum que significava tributo, e dando-se deste reparo aviso (ao mesmo mandarim), respondeu, que já adiante tinham ido outros memoriais e outras listas, em que não iam as palavras Cim Kum, mas sim outras, que não denotavam tributo; e com esta desculpa, ou engano manifesto, foi preciso que o embaixador se acomodasse, porque não é possível fugir em tudo dos costumes, e formulários daquele Império. O que nos ditos memoriais se dizia ao Imperador, era o seguinte: “o embaixador de Portugal chegou a Cantão, de lá veio para a Corte, com bom tratamento; tem tido a fortuna de ver a cor do Céu (id est o Imperador); agora oferece com reverência as coisas que traz do seu rei para a Vossa Majestade Imperial.” No dia 7 de junho se conduziu o mimo de Sua Majestade para a quinta do Imperador, quase na mesma ordem com que se tinha conduzido quando entrámos na Corte. Logo que chegámos à quinta, ou Jardim de Perpétua Claridade, Yuen mim Yuen, como o Imperador lhe chama, se recolheu o mesmo mimo para palácio, aonde logo se principiou a ver, e também algumas coisas que o embaixador também em seu nome ofereceu; e nós nos recolhemos a descansar, e a comer em uma sala, aonde em todas as ocasiões nos recolhíamos e comíamos juntamente, do que o Imperador mandava, que sempre era em abundância, mas tudo à sua moda, que é algum tanto desagradável para quem não tem o seu costume; e em umas e outras assistiam sempre ao embaixador alguns mandarins que o Imperador determinava em sinal da estimação que do mesmo embaixador fazia, e fez sempre enquanto estivemos na Corte, e no seu Império. Passado algum tempo chegou um mandarim da parte do Imperador dizendo: “que na China não era descortesia receber umas coisas, e outras não, que dissesse o embaixador o que se costumava no seu reino; porque mandando El-Rei de Portugal coisas de tão longe e sendo a sua lembrança nascida do coração lhe não queria ele Imperador fazer descortesia alguma”. O embaixador lhe respondeu: “que o contrário costume havia no nosso reino nesta matéria, e que Sua Majestade sentiria muito que o Imperador não aceitasse todas as coisas que Sua Majestade lhe mandava”; e dizendo então o mandarim: “que em tais termos recebia o Imperador tudo, sem embargo de que eram muitas as coisas que Sua Majestade mandava”. Replicou o embaixador, dizendo: “que eram muito poucas as coisas à vista do grande ânimo de El-Rei de Portugal, e desejo que tinha de significar o seu afecto ao Imperador”. E dito isto, batemos todos três vezes cabeça em acção de graças; e depois a bateu o embaixador somente em agradecimento também de se lhe aceitarem as coisas que em seu nome ofereceu ao Imperador, de cuja saúde também perguntou, estando de joelhos, como é costume; e com isto nos despedimos, sem que nesta ocasião, nem em outras, em que também batemos cabeça, avistássemos o Imperador. No dia 9 mandou o Imperador ao embaixador um conto de réis, que ele recebeu, e rendeu logo as graças, batendo cabeça na presença de uns mandarins de palácio, que foram os portadores. E no dia onze, alcançou o embaixador licença para pessoalmente no dia 13 ir à sua

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