Jorge Godinho - Direito do jogo - ABAMAPLP

15 DIREITO DO JOGO Prefácio Este livro procura oferecer uma panorâmica geral do direito do jogo. O jogo é aqui entendido como o conjunto formado por todas os jogos, apostas e lotarias em cujo desfecho é arriscado património.Trata-se, na expressão popular, do «jogo a dinheiro», no preciso sentido explicitado no texto. A exposição versa o sistema jurídico da Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China. É por isso dedicada uma especial atenção à exploração comercial, autorizada por lei e efectivada por meio de contratos administrativos, dos jogos de fortuna ou azar ― uma área em que Macau é líder mundial e tem uma história longa e riquíssima,de 1849 até hoje.No entanto,como seria de esperar, a obra não se limita à realidade de Macau e busca construções dogmáticas transponíveis para outros sistemas jurídicos, desde logo para Portugal. A navegação destas águas rodeia-se de múltiplos escolhos que dificultam a investigação e contribuem para explicar as limitações desta pesquisa: a) a interdisciplinaridade do tema; b) a sua sensibilidade ético-social e mutabilidade; c) os problemas postos pelo secretismo, pela falta de transparência e pela dificuldade de acesso a certas fontes; d) a grande exposição mediática; e) a complexidade regulatória reinante; f) a escassez de jurisprudência e de doutrina; g) vários limites à investigação histórica. Justifica-se assim um prefácio anormalmente longo como forma de prestar indicações metodológicas sobre os instrumentos disponíveis na rota e logo sobre o que terá ficado por descobrir. a) O jogo é matéria radicalmente interdisciplinar em sentido amplo: convoca saberes de vários continentes como a matemática e o cálculo de probabilidades, a psicologia, a sociologia e a criminologia, a economia e a gestão de empresas, as finanças públicas ou a informática, entre outros. E é matéria interdisciplinar no âmbito jurídico: convoca vários ramos do direito e perspectivas normativas de análise. Onde o jogo a dinheiro seja interdito tratar-se-á basicamente de uma narrativa jurídica proibicionista e punitiva, ou seja, penal e de polícia. Lá onde seja autorizada e regulada a oferta de jogo em massa tal relevará desde logo dos ângulos administrativo, fiscal e comercial. Onde o jogo não organizado em moldes comerciais seja tolerado surgirão especiais discussões do ponto de vista contratual-civil. Estas perspectivas jurídicas coexistem na prática: como se sabe, Macau autorizou e regulamentou a exploração comercial de várias formas de jogo, mas existem contextos de jogo que são proibidos por lei penal e há ainda jogo que é meramente tolerado. Esta natureza interdisciplinar nada tem de paradoxal

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