32 JORGE GODINHO arranque de uma disciplina do direito do jogo que tudo isto pretendesse abarcar seria demasiado amplo e procederia a uma conjugação de realidades lúdicas inteiramente distintas, oferecidas a crianças, menores e adultos. Entendemos que a disciplina académica, seguindo as indicações dos dados legais, se deve restringir ao direito do jogo a dinheiro, um assunto polémico e que só pode ser oferecido a adultos, e não se deve dissolver num amplíssimo tratamento do entretenimento ou do lazer. Diga-se que o jogo, em geral, onde não esteja em causa dinheiro, tem seguramente muitos aspectos positivos. Pode-se mesmo afirmar que o acto de jogar é uma componente ou aspecto da vivência humana.Todas as pessoas jogam de uma forma ou outra durante a vida, e certamente durante a infância. O papel do jogo no desenvolvimento social e intelectual das crianças é amplamente reconhecido. O jogo é de fundamental importância durante a primeira infância, uma vez que ajuda o desenvolvimento do raciocínio e do pensamento abstracto. Neste sentido, o direito a jogar/brincar é reconhecido na Convenção sobre os Direitos da Criança, cujo artigo 31.° dispõe15: Os Estados Partes reconhecem à criança o direito ao repouso e aos tempos livres, o direito de participar em jogos e actividades recreativas próprias da sua idade e de participar livremente na vida cultural e artística. Os jogos são uma parte da educação e desenvolvimento normal de todas as crianças, ou devem sê-lo. Quanto aos adultos, muitos jogam regularmente uma variedade de jogos, nomeadamente certos jogos sem interacção com outras pessoas, ditos «solitários» (jogos de cartas, jogos de suporte informático como os da série Angry Birds), como passatempo, o que consiste numa forma de exercício da liberdade pessoal em que o Estado não deve interferir e cuja restrição não teria fundamento. Há assim um amplo domínio que fica de fora desta disciplina. Desde jurídicos parece claro, mas esta matéria regula-se pelo regime geral dos contratos e não encontra resposta no art. 1171.º do Código Civil, que apenas se preocupa com os casos em que está em jogo dinheiro. O jogo aqui em causa tem implicações patrimoniais mas não as que derivam do apuramento do resultado do jogo (ganhar ou perder) mas sim as que derivam da própria execução do jogo em si, que são expectáveis e não têm natureza aleatória. 15 Adoptada em Nova Iorque, em 20 de Novembro de 1989; cfr.Aviso do Chefe do Executivo n.° 5/2001, in Boletim Oficial, n.° 2, II.ª Série, de 10 de Janeiro de 2001, 69.
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